O conceito e o estudo dos tipos de inteligência humana remontam ao final do século XIX, com Sir Francis Galton (curiosamente um primo do famoso cientista da evolução Charles Darwin). Galton criou uma espécie de laboratório visando testar se a inteligência era uma habilidade mental adquirida ou um produto da evolução biológica.
Esses estudos de Galton pavimentaram o caminho do outros estudiosos para os séculos seguintes sobre os tipos de inteligência. Enquanto alguns pesquisadores acreditam que a inteligência é uma habilidade desenvolvida junto ao ambiente em que se vive, outros defendem que se trata de uma gama específica de talentos genéticos e inatos.
Charles Spearman, por exemplo, foi um psicólogo inglês que se referia à inteligência como um conjunto de múltiplas habilidades (verbal, espacial, numérica, mecânica), lá em 1904. Em sua ótica, a inteligência era, portanto, um fator único, que representava uma soma de tudo, algo que se aproxima dos tipos de inteligência que vamos explorar ao longo desse artigo.
Algumas décadas mais tarde, esse conceito foi contestado por Thurstone, segundo quem haveria sete habilidades mentais primárias e, embora poderia existir de fato algo como uma “inteligência geral”, como a definição de Spearman, também existiriam tais tipos de inteligência específicos.
Na esteira de Thurstone, chega a teoria das múltiplas inteligências do psicólogo americano Howard Gardner, a partir de 1983. Para ele, não há uma única inteligência somativa, mas, sim, tipos de inteligência que são únicas, independentes e distintas.
No início, também eram sete tipos de inteligência: linguística, lógica-matemática, espacial, musical, cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Alguns anos mais tarde, Gardner acrescentou à lista outros dois tipos de inteligência: naturalista e existencial.
O cientista explica que todos nós temos os nove tipos de inteligência, mais ou menos desenvolvidas, e que a grande maioria de todas as atividades que executamos envolvem a combinação de mais de uma dessas múltiplas inteligências.
Tal teoria foi bastante criticada (e continua sendo, na verdade), devido à falta de estudos empíricos de fôlego que sejam capazes de sustentá-la, de fato.
Por que é importante conhecer os tipos de inteligência
Apesar de fortemente discutida, a teoria dos nove tipos de inteligência de Gardner tem despertado o interesse de diversos estudiosos que buscam uma visão mais ampla e holística do desenvolvimento infantil.
Isso porque um entendimento mais profundo dos diferentes tipos de inteligência promove uma melhor compreensão da inteligência como construção, sugerindo que todos temos um potencial de crescimento maior do que aquele que a sociedade aceita e explora.
É uma maneira de entendermos, por exemplo, que uma pessoa que não tem talento para matemática pode muito bem se destacar em outras áreas, tais como comunicação verbal, liderança ou esportes.
Em resumo, é talvez a melhor forma de percebermos que se você não se sai bem na hora interpretar um texto ou em exercícios de lógica não significa que você não seja esperto ou inteligente o suficiente!
Os 9 tipos de inteligência
A teoria dos nove tipos de inteligência de Gardner veio revolucionar a ideia do Quociente de Inteligência (QI), segundo o qual o ser humano possui uma espécie de computador central que armazena nossa inteligência.
Ao contrário, seriam múltiplos tipos de inteligência, cada uma representando um tipo de processamento de informação. Vamos dar uma olhada em cada um dos nove tipos de inteligência teorizados por Gardner
Inteligência linguística
Esse é um dos tipos de inteligência que trata da sensibilidade que temos em lidar com a linguagem, seja ela falada ou escrita. É a nossa capacidade de aprender idiomas, de usá-los para alcançar nossas metas, de pensar em forma de linguagem e expressar significados mais complexos.
As pessoas que desenvolvem tal habilidade apreciam ler, escrever, contar histórias e fazer cruzadinhas, por exemplo, já que são capazes de encontrar as palavras mais adequadas para expressar suas ideias.
Você tem um alto nível de inteligência linguística se:
- Tem facilidade com as palavras e conseguem persuadir e convencer as outras pessoas por meio do discurso;
- Tem vocabulário rico e sabe quando e onde aplicar as palavras certas;
- Gosta de ler e escrever bastante, e de jogos de palavras;
- Tem facilidade com idiomas estrangeiros.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: advogados, palestrantes, escritores, jornalistas, políticos, entre outros.
Inteligência lógico-matemática
É a nossa capacidade de analisar os problemas logicamente, investigar, calcular, quantificar, considerar hipóteses etc. Permite que consigamos perceber relações, conexões e padrões, além de elaborar pensamentos simbólicos e sequenciais.
Esse é um dos tipos de inteligência que as pessoas que tem são hábeis em cálculos, equações e problemas abstratos. Também se interessam por questões lógicas, padrões e categorizações, e encontram com facilidade conexões e relações que passam despercebidas aos outros.
Você tem um alto nível de inteligência lógico-matemática se:
- Tem jeito com números, como operações matemáticas e aritméticas;
- Gosta de fazer experimentos e conduzir investigações, a fim de provar hipóteses;
- Aprecia jogos de lógica e estratégia;
- Se interessa por mistérios e enigmas.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: matemáticos, cientistas, contadores, analistas de sistemas, detetives, jornalistas investigativos, entre outros.
Inteligência espacial
Envolve o nosso potencial em reconhecer e manipular o espaço ao nosso redor, bem como imagens em larga ou pequena escala.
As pessoas com inteligência espacial superior pensam em três dimensões e têm uma imaginação muito ativa. Também costumam ter habilidade artística e gráfica, gostam de desenhar e se interessam por jogos como quebra-cabeças.
Você tem um alto nível de inteligência espacial se:
- É altamente consciente do ambiente ao seu redor;
- Tem grande habilidade com navegação e alto senso de localização e direção;
- Gosta de jogos que envolvam mapas e quebra-cabeças;
- Aprecia desenhar e manipular imagens;
- Tende a criar cenários em sua cabeça.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: escultores, cirurgiões, enxadristas, artistas gráficos, arquitetos, pilotos, velejadores, pintores e designers.
Inteligência motora
Refere-se ao nosso potencial de usar nosso corpo (ou partes dele) para resolver problemas e desenvolver atividades. Envolve principalmente nossa habilidade física de manipular os elementos ao nosso redor.
Pessoas com esse tipo de inteligência bem adiantada conseguem usar o próprio corpo para criar produtos e marcas, costumam ter coordenação e consciência corporal superiores, e se destacam nos esportes e atividades físicas.
Você tem um alto nível de inteligência motora se:
- Tem boa consciência corporal e conhece seus próprios limites;
- Consegue se comunicar bem por meio de gestos e linguagem corporal;
- Sente-se confortável com contato físico;
- Tem jeito com as mãos e boa motricidade fina;
- Gosta de construir coisas e trabalhos manuais.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: bailarinos, atletas, cirurgiões, mecânicos, carpinteiros, fisioterapeutas, acrobatas, artesãos, entre outros.
Inteligência musical
Trata-se da nossa habilidade tanto em compor quanto em apreciar e compreender padrões musicais. Nos permite reconhecer, criar, reproduzir e refletir sobre a música.
As pessoas com inteligência musical superior têm facilidade em distinguir tom, timbre, ritmo e melodias. Estão sempre conscientes dos sons ao seu redor (inclusive daqueles que os outros sequer se dão conta) e costumam cantarolar ou batucar com frequência.
Você tem um alto nível de inteligência musical se:
- Consegue discernir e desmembrar sons (seus tons, ritmos e timbres);
- Ama compor e estudar música;
- Sente-se confortável com música ao fundo ao executar outras ações, mesmo aquelas que exijam concentração;
- É bastante sensível até ao menor som e escuta aquilo que os outros nem percebem.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: cantores, compositores, DJs, músicos, maestros, engenheiros de som, bailarinos etc.
Inteligência interpessoal
É a nossa capacidade de entender as intenções, motivações e os desejos de outras pessoas, nos permitindo interagir melhor com elas. Envolve comunicação efetiva, tanto, verbal quanto não-verbal, e sensibilidade aos humores e temperamentos alheios.
As pessoas com essa inteligência desenvolvida costumam ser reconhecidas como gente com alta inteligência emocional (QE), e costumam ser líderes entre seus pares, devido à facilidade em se comunicar e à empatia com as emoções dos demais.
Você tem um alto nível de inteligência interpessoal se:
- Consegue enumerar facilmente as características de cada pessoa;
- Tem um amplo círculo de amigos e conhecidos;
- Sente-se bem no meio de outras pessoas;
- Percebe facilmente os humores alheios;
- Consegue visualizar as situações de diversos pontos de vista.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: professores, psicólogos, gestores, vendedores, relações públicas, servidores sociais, políticos, atores, entre outros.
Inteligência intrapessoal
É sobre a nossa capacidade de entendermos a nós mesmos, incluindo nossos anseios, medos e aptidões – e de usar essa informações para nosso próprio benefício. Esse tipo de inteligência nos permite entender o que é prioridade em nossas vidas e reconhecer nossos próprios humores e intenções.
As pessoas com alta inteligência intrapessoal podem ser tímidas, mas são muito conscientes de seus sentimentos e motivações – eles sabem o que querem e/ou necessitam. E, por isso mesmo, também são sensíveis a condição humana como um todo, buscando respeitar as escolhas e emoções das outras pessoas.
Você tem um alto nível de inteligência intrapessoal se:
- É automotivado, conseguindo se colocar em primeiro lugar;
- É independente, obstinado e tem facilidade em aprender sozinho;
- Tem consciência do que está sentindo e da direção da sua vida, sem precisar que outros lhe digam o que fazer;
- Tende a ser introvertido, apreciando momentos sozinho para autorreflexão.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: terapeutas, filósofos, líderes espirituais, psicólogos, conselheiros, entre outros.
Inteligência naturalista
Trata-se da nossa habilidade de identificar e distinguir diferentes tipos de plantas, animais, formações meteorológicas, padrões climáticos, enfim, tudo aquilo encontrado na natureza.
Essa habilidade é uma herança importante de nosso passado evolutivo como caçadores e fazendeiros. Acredita-se, ainda, que tal inteligência é empregada quando distinguimos marcas e produtos, como carros, tênis, maquiagens ou smartphones.
Você tem um alto nível de inteligência naturalista se:
- Ama natureza e passar tempo ao ar livre;
- Conecta-se facilmente com animais;
- Tem dedo verde e os animais se aproximam de você com segurança e interesse.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: botânicos, agricultores, biólogos, astrônomos, meteorologistas, geólogos, guardas florestais, entre outros.
Inteligência existencial
Essa pode soar com um tipo de inteligência mais profunda. É nossa habilidade de lidar com questões existenciais, pensar filosoficamente, conhecer nossa intuição, entender o mundo e a humanidade, além de “prever” o futuro a partir dos padrões do presente e passado.
Você tem um alto nível de inteligência existencial se:
- Você se interessa por perguntas como “por que vivemos”, “por que morremos”, “o que há depois da morte” etc.;
- Você é muito sensível às questões da existência humana.
Algumas carreiras que se beneficiam desse tipo de inteligência são: psicólogos, teólogos, palestrantes motivacionais, filósofos, coaches, entre outros.
Como pensar em hábitos para os tipos de inteligência
Quando identificamos os tipos de inteligência que são superiores em nós mesmos, ou ainda quando definimos quais entre os nove queremos desenvolver (sempre lembrando que todos nós temos todos os nove tipos de inteligência em maior ou menor graus), é interessante que estabeleçamos alguns hábitos que nos possibilitem fomentá-los. Por exemplo:
- Inteligência linguística: ter um canal do YouTube ou um podcast que lhe permita verbalizar seus interesses e aptidões, falar sobre sua realidade, contar seu dia a dia, dar suas opiniões, apresentar seus projetos etc.; manter um diário a ser preenchido como parte de sua rotina noturna, registrando o que aconteceu de bom e o que poderia ser melhor; ler (leituras como parte da sua rotina matinal ou noturna podem ajudar a lidar com a sua ansiedade e melhorar o seu sono, inclusive); estudar um outro idioma.
- Inteligência lógica: organizar seu dia (pessoal ou profissional) e planejamento semanal, por meio de planilhas para acompanhamento e outras ferramentas, tais como o Método MoSCoW, Matriz de Eisenhower, Método GTD, ou mesmo por meio de um planner.
- Inteligência motora: dedicar um tempo em sua rotina diária para praticar esportes, atividades físicas ou trabalhos manuais que reforcem suas aptidões, e outro para meditação guiada ou mindfulness, de forma a exercitar sua consciência corporal.
- Inteligência espacial: separar um tempo em sua agenda para desenvolvimento de atividades artísticas, criativas e pictóricas, tais como desenho, escultura, artesanato, entre outros.
- Inteligência musical: o melhor é aprender e praticar cotidianamente um instrumento musical, canto e voz, dança ou qualquer outra atividade que seja baseada no estudo ou apreciação de sons e música.
- Inteligência interpessoal: fazer atividades em grupo, manter hábitos que sejam realizados em parceria com colegas, familiares ou amigos, ter um espaço diariamente para conversar e discutir ideais com pessoas queridas.
- Inteligência intrapessoal: buscar o autoconhecimento, seja com auxílio de ferramentas como a roda da vida, através de terapia, ou por meio do estudo de suas próprias crenças limitantes e sabotadores da mente. Exercitar a gratidão diariamente e praticar mindfulness ou meditação guiada também podem despertar a autorreflexão.
- Inteligência naturalista: estar em contato com a natureza periodicamente, realizar atividades ao ar livre, viajar para locais abertos, manter um jardim ou uma horta, fazer cursos ou estudar por si mesmo assuntos de cunho naturalista, tais como plantas, pedras ou astronomia.
- Inteligência existencial: estabelecer uma conexão com a sua espiritualidade, seja por meio de funções religiosas externas ou não, orações e preces, meditação, mindfulness, e afirmações positivas.
Outros tipos de inteligência
Além desses nove tipos de inteligência, o palestrante, comediante e professor de criatividade Murilo Gun também trouxe à tona duas outras inteligências que têm se destacado na atualidade: a inteligência interartificial e a inteligência aprendedora ou educadora:
Inteligência interartificial
Descrita por Gun como um dos tipos de inteligência que nos permite usar as tecnologias disponíveis e não ser usados por elas. Com o mundo cada vez mais tecnológico e conectado em que vivemos, é preponderante que sejamos capazes de tirar o maior proveito de todas as possibilidades, mas sem cair na ameaça do vício digital.
Para isso, é importante que você esteja frequentemente vigilante sobre seu comportamento em relação ao mundo high-tech. Por exemplo, você está completamente consciente quando olha para a tela de seu celular ou liga o seu laptop?
Inteligência aprendedora ou educadora
É sobre a nossa capacidade de ser autodidata, de aprender sozinhos, sem que ninguém precise nos dizer o que e como fazer. Também se refere à nossa curiosidade, nossa sede de informação e de conhecimento.
Essa inteligência tem, portanto, tudo a ver com o que chamamos de lifelong learning, isto é, o nosso desejo por nos mantermos em constante aprendizado, ao longo de toda a nossa vida, independentemente de um ambiente educacional formal ou técnico e corporativo.
Conclusão
Por fim, é sempre válido reiterar que os nove tipos de inteligência – e agora, onze – aqui citados, são compartilhados por absolutamente todos os seres humanos, em maiores ou menos níveis de aptidão.
No entanto, a nossa experiência de aprendizagem para esses tipos de inteligência e a maneira como adquirimos conhecimento não necessariamente estão ligadas às nossas inteligências mais desenvolvidas. Por exemplo, nem sempre uma pessoa com inteligência linguística apurada irá preferir aprender por meio da leitura.
Como tudo na vida, não existe uma regra pré definida, mas conhecer os tipos de inteligência pode te ajudar a direcionar a forma como aprende e realiza as coisas no seu dia a dia.
Tanto o processo de aprendizado quanto o conceito de inteligência são fluidos e complexos e é imperativo que evitemos empregar teorias para rotular as pessoas ao nosso redor.
